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Entrevista Venial Sin

COM MORAL PARA PECAR
"Uma banda são todos os seus elementos em uníssono"

Chegaram com “pezinhos de lã” e de uma terra com algumas tradições no metal, mas pouco para oferecer em termos de carreira. Não se ficaram, por isso, pelos ajustes e puseram mãos à obra para demonstrar que, independentemente da origem, o talento emana e pode/deve ser propalado. Os vila-realenses Venial Sin surgem em 2008 com uma vontade depravada de fundir música extrema com ambientes angelicais e introspectivos. Filhos bastardos de uns Opeth e Pink Floyd, mas também de um manancial enorme de outras influências menos óbvias, criaram um EP de estreia que faz apontar holofotes para o que a banda liderada pelo ex-Thee Orakle, Pedro Matos, pode fazer no futuro. E não podíamos ter ido bater a outra porta.  

Perdem três elementos já depois de “Sphere Of Morality” estar gravado. Foi um grande “susto”? De que forma isso afectou os planos da banda?
Quando alguém, por qualquer motivo, sai de uma banda, causa sempre impacto, seja a nível musical ou ambiental. Imagine-se então quando saem três elementos em bloco! Muita coisa se perde e muita se ganha. Até agora, e após a reestruturação imediata da banda - o que aconteceu em grande parte devido a um grande querer e sintonia entre os seus membros fundadores -, só temos a enaltecer todas as decisões tomadas que levaram a que os Venial Sin pudessem minimizar o tempo de espera em relação a um possível regresso aos palcos. O que, de facto e felizmente, veio a acontecer, pois tivemos a sorte de no espaço de poucas semanas apresentarmo-nos ao público na máxima força, graças à disponibilidade imediata dos actuais membros. Isto para uma banda de Trás-os-Montes tornou-se um belo feito, pois facilmente poderíamos ter ficado numa situação que pudesse comprometer os planos da banda.

Como se pode entender três saídas simultâneas? Será que, à semelhança de muitos outros projectos, a banda conversou e estabeleceu objectivos muito sérios que não estariam ao alcance da disponibilidade desses membros?
Houve sempre um grande espírito e bom ambiente em redor da banda, o que aconteceu ao longo de todos estes anos, quer com elementos mais antigos, quer com os actuais elementos, embora todos diferentes e todos enriquecedores. Três saídas da banda num momento crucial e de alguma agitação a nível pessoal entre alguns dos elementos da banda, conduziram a uma saída em bloco. Os objectivos que tínhamos delineado para o pós-lançamento de “Sphere Of Morality” estão a ser cumpridos, bem como novos que vão surgindo.

Você acumula várias funções como músico. Será, por isso, o maior visionário e timoneiro na composição?
Sim, de facto ao longo de todo o tempo de existência dos Venial Sin tenho sido, juntamente com Hélder Guedes, o pilar das composições. Todavia, sei reconhecer que sem os restantes membros nunca poderíamos partir para mostrar o nosso trabalho. Chegámos a pontos em que estivemos quase dois anos em dueto, o que logicamente me deu mais azo para poder compor e repensar com bastante liberdade todo o esboço musical do nosso actual repertório. Mas creio que uma banda são todos os seus elementos em uníssono, quer em termos musicais, quer em termos de auto-dedicação, ou não fosse a música aquilo que nos move sempre mais além!

Quais são as suas maiores influências?
Ouço um bocado de tudo e considero-me bastante eclético, graças à educação musical que tive em casa e que sempre me acompanhou desde que nasci - culpa dos meus pais que felizmente sempre foram e são grandes apreciadores de boa música. Desde o metal até à música contemporânea, passando pelo rock mais progressivo, jazz até aos sons africanos, étnicos, electrónicos, etc.

Gosta de Anathema ou Pink Floyd, por exemplo? Serão eles algumas das grandes inspirações na criação de ambientes etéreos?
Sinceramente, gosto e tenho o prazer de acompanhar as suas carreiras, embora como em todas as discografias, há sempre álbuns com abordagens únicas e que promovem um gosto continuado, que não desvanece. Quanto à parte da inspiração confesso que felizmente nunca compus algo com a ideia de ser parecido com esta ou aquela banda. Simplesmente as melodias saem-me, vão ganhando forma naturalmente e amadurecendo mediante o caminho que lhe poderemos dar. Logicamente que sou influenciado por tudo o que ouvi, senti ou mesmo vi. Esta é uma questão que em tudo tem a ver com o sentimento que temos no momento, em que um motivo melódico ou rítmico nos encaminha para esta ou aquela ambiência. A música ganha vida própria nesta dimensão do criar, onde o essencial é saber analisar bem a sua estética, a meu ver.

Dizia há pouco que são também apreciadores de música electrónica e tradicional. Quer especificar?
Sim, devido a sermos apreciadores de um vasto espectro musical bastante antagónico e divergente que se completa. A electrónica está presente na música há já algumas décadas, pelo que é nos dias de hoje impossível dissociarmo-nos dela. No que toca à música tradicional, esta adquire um carácter mais sentimental ligado às raízes de cada um. Posso citar, por exemplo, a Banda do Casaco, com uma forte componente popular. Certamente que em futuras composições dos Venial Sin estes espectros musicais terão o seu espaço reservado com maior relevo.

Dada a ambivalência da vossa música, é sempre curioso tentar perceber como funciona a escrita. Será que existem dificuldades acrescidas para conseguirem fundir harmoniosamente elementos pesados e calmos? Pode falar-se em bloqueios momentâneos?
Como referi anteriormente gosto do imprevisível, bem como do efeito positivo que podemos tirar dele. Daí estes contrastes assumidos também na nossa música. Cabe saber sempre aguardar pelo melhor momento para delinear essa fusão, criando assim um efeito surpresa, onde a música assume também aí o seu próprio caminho. Por vezes há bloqueios, mas incidem normalmente na direcção musical a seguir dentro da linha melódica ou rítmica, pois um brotar de novas ideias surge sempre que acabado um trecho musical. É uma questão de uma certa gestão de recursos musicais onde estes, bem combinados, levam a um “apogeu musical”.

O Guilhermino Martins é, indiscutivelmente, uma pessoa muito talentosa e experienciada da nossa “praça”. O seu contributo para este registo foi meramente do ponto de vista da engenharia ou também actuou como produtor?
Toda a composição de “Sphere Of Morality” foi elaborada pelos Venial Sin. Mas acontece que quando se unem pessoas com talento, naturalmente todo o produto final sairá enriquecido. Pudemos contar com todo tipo de apoio por parte do Guilhermino, até porque o facto de nos conhecermos há muito, assim o permitiu. Foi, sem dúvida, uma boa e enriquecedora experiência, onde tanto a banda como o Guilhermino foram maturando a par de todos os processos de criação do EP, sem grandes pressões. Falo quer da parte técnica como também de pormenores que se revelaram uma mais-valia no produto final. Pudemos contar com a conhecida experiência imprimida nos Blind & Lost Studios, em Santa Marta de Penaguião.

Não estou completamente certo, mas este trabalho foi ou teve para ser masterizado pelo “monstro” Dan Swanö…
A ideia original consistia em realizarmos as captações e mistura nos Blind & Lost Studios e fazer posteriormente a masterização nos Unisound Studios pelo “monstro” Dan Swanö. Houve até conversações… Entretanto, acreditámos que para um EP não faria muito sentido gastar uma avultada quantia, ainda mais quando o Guilhermino estava a realizar um excelente trabalho. Decidimos assim atribuir a este EP uma identidade puramente transmontana, feito por e com gente da “casa”!

“Sphere Of Morality”, embora seja um EP, tem mais de meia-hora de duração. Porque assumiram esse formato e não já o álbum?
Facilmente poderíamos ter enveredado pela elaboração de um álbum, até porque gravámos mais temas do que aqueles que estão no line-up do EP. Acreditamos que uma banda ganha mais consistência dando passos seguros e firmes, não queríamos dar um passo maior do que a perna, o que por vezes acontece com muitas bandas. Dessa forma, optámos pela escolha de seis temas. Futuramente, iremos compor um longa-duração. Quando este estiver materializado, certamente haverão mais pessoas a conhecer a banda, o que aumenta a expectativa em todos os sentidos. De outra forma, e aqui em Portugal, se lançássemos um álbum agora, iríamos ser “abafados” por bandas que já vêem o seu nome mais reconhecido.

Terá sido também em razão da sua duração e/ou complexidade que demoraram cerca de seis meses a gravá-lo?
Não, o grande motivo por que demoramos “tanto tempo” deveu-se ao facto de termos primado pela calma, sabendo que a pressa se torna inimiga da perfeição. Sabíamos que se fizéssemos as coisas da forma como foram feitas poderíamos ter mais gozo e aproveitar ao máximo todos os momentos dos processos envolvidos na concepção de “Sphere Of Morality”. Aproveitámos também para crescer como banda, vivendo experiências enriquecedoras que permanecem intactas. Não creio que fosse o facto de os temas serem mais ou menos curtos ou complexos que tivesse contribuído para tal. Como disse, sempre soubemos o que queríamos quando entrámos em estúdio.

Até ao momento, que balanço faz do impacto e promoção feita a “Sphere Of Morality”?
Até agora todas as reacções têm sido bastante positivas e muito motivadoras. Ainda é relativamente cedo também para dizer, pois apenas foi editado e apresentado ao público no passado dia 25 de Fevereiro. O público tem reagido calorosamente ao nosso som e contamos já com algumas reviews, entrevistas e presenças em compilações. Também temos passado nas rádios, quer em Portugal, quer no estrangeiro. É motivo de enorme orgulho saber que a nossa música chega ao público e é ouvida.

Pode-se encontrar uma mensagem transversal a todo o álbum ou cada tema foca uma mensagem específica?
Todo o EP faz sentido quando juntamos as suas “peças”, o que promove uma continuidade válida por partes. Desta forma tentamos expressar sentimentos num espectro variado visando e focando a mensagem principal que queremos passar com toda a esfera da moralidade patente nos dias de hoje, bem como do que dela podemos extrair, reflectir, alterar... Cada um deve ir de encontro à sua própria moratória! Faço questão de referir que fazem parte deste EP os temas “Real End” e “Sphere Of Morality – Parte 2 “ que compus especialmente em memória do meu pai!

O facto de estarem localizados fora das “metrópoles”, é uma vantagem ou desvantagem?
Ambos! Confesso que tenderá para a desvantagem, pois para além de não haver associação de bandas do género, não há sequer salas de ensaio ou mesmo palcos onde as bandas, tanto da região como de fora dela, se possam mostrar com qualidade. Ao invés, nos sítios onde existem condições, basicamente só toca quem é amigo do amigo, entre outras situações, como a questão do género musical, etc. A vantagem reside no factor ambiental que permite um certo refúgio que se vai reflectir na composição. Algo diferente é sempre algo único que está ligado à forma como a banda vive, bem como o espírito que possui e suas experiências.

Acreditam na profissionalização? Como vêm toda a actual conjuntura da indústria musical?
Acreditamos que para chegar à profissionalização actualmente em Portugal, é necessário muito mais do que apenas fazer bons registos - um desafio enorme só por si. Acreditamos que uma banda deve ser pró-activa e muito dinâmica, sempre com uma atitude muito positiva e empreendedora em redor dos seus objectivos, aprendendo com os erros e tirando o melhor partido da sua experiência e maturidade. Tentaremos levar os Venial Sin ao maior número de pessoas possível, independentemente da música que toquemos, pois é mesmo a paixão pela música e a libertação que dela surge, o factor que nos move também nesse sentido. Claro que a indústria musical está cada vez mais centrada naquilo que vai sendo considerado como o mainstream de cada género musical, moldando também ela própria a sua esfera musical.

Muito directamente: como se pode ser diferente, original e entusiasmante hoje em dia ao ponto de convencer um público cada vez menos permeável e com os ouvidos tão “cheios”? Acreditam marcar a diferença com a vossa música?
Tentar ser original é fácil, o difícil será, certamente, conseguir e manter a originalidade na criação. Ao fazer o que gostamos podemos realmente atingir essa meta, de onde advém uma forte componente de satisfação. Cada vez mais será difícil inovar, mas a inovação existirá sempre, dependendo da forma como se conjuguem os recursos e se faça a abordagem às temáticas e ambientes criados na música. Creio que existe espaço para todos os géneros. Lamento apenas a falta de abertura musical que se revela muito entranhada nos ouvintes que estão presos aos géneros predominantes controlados pela indústria e marketing associado.

Há alguma banda ou artista que vos sirva de exemplo do ponto de vista da gestão de carreira?
Posso mencionar nomes como Devin Townsend, Brendan Perry e Lisa Gerrard dos Dead Can Dance, entre outros como o conhecido Dan Swanö e até Andrew Latimer e Peter Bardens dos Camel. Todos estes nomes e outros protagonizaram e cimentaram grandes carreiras musicais, bem estruturadas e de uma forma bastante consistente que com certeza continuarão a ser uma forte influência para a música em geral. Isto acontece devido ao facto destes músicos terem protagonizado produtos únicos e marcantes ao longo das suas carreiras musicais, destacando-se pela originalidade e suas fusões inovadoras e cativantes nas suas criações.

A banda edita este EP pela Infektion Records. Esta parceria está a correr dentro das vossas perspectivas? Foi um peso que saiu-vos de cima ao saberem que há alguém que ajuda na promoção?
Depois de termos analisado algumas propostas de outras editoras, os Venial Sin decidiram editar o EP através da Infektion Records. E está tudo a correr como o previsto. O EP está no mercado, temos tido reacções muito positivas e a banda tem-se apresentado em palco com regularidade. Em termos de promoção a editora tem realizado um trabalho bom e muito profissional, o que para nós demonstra e enaltece um espírito de confiança revelado desde o início. Certamente que continuaremos com todo o processo de promoção interna na banda realizado nas nossas plataformas digitais. Paralelamente, estamos também a tentar viabilizar uma proposta que nos foi endereçada, de forma a celebrar um contrato de promoção pela conceituada promotora alemã Gordeon Musik. Mas cada coisa a seu tempo.

O que se pode considerar um bom acordo editorial para uma banda como a vossa neste momento? Quer falar-nos um pouco dos contornos desse contracto, que foi privilegiado em detrimento de outros?
Para uma banda no patamar dos Venial Sin, neste momento o ideal foi mesmo o que sucedeu com a Infektion. Pudemos atingir uma visibilidade que não seria possível sem a editora. Esta possui também mecanismos de promoção e publicidade que se tornam uma mais-valia para nós. O contrato é em contornos de parceria, envolvendo a duração de um ano para a edição e promoção de “Sphere Of Morality”. Advém daí um espaço que pretendemos conquistar e que consiste em poder dar a conhecer um pouco mais dos Venial Sin. Hoje em dia, apenas bandas que chegam ao topo possuem verdadeiros contratos discográficos, onde mediante X anos poderão compor X álbuns, com tudo gratuito para a banda r com digressões integradas, promoções, etc. Mas para tal também não bastam muitos anos de estrada. O factor sorte está sempre associado!

Há algum membro dos Venial Sin que viva a música para além das fronteiras da banda?
Todos os membros dos Venial Sin tiveram bandas no passado, mas actualmente o nosso mais recente vocalista [Renato Sousa] continua com os Aranvm Woods, banda de black metal. Eu trabalho como professor de música incentivando e transmitindo o gosto por esta aos mais novos, o que me permite estar sempre em contacto com a esfera musical e envolvido noutros projectos do género.

Sei que foi membro dos Thee Orakle. Continua a seguir a carreira deles?
Como é sabido, sou membro fundador dos Thee Orakle e tive o prazer de fazer parte dos dois primeiros registos da banda. E certamente que acompanho o seu percurso musical, até porque diferenças aparte, somos todos amigos e convivemos em harmonia, frequentando os mesmos sítios desde há anos. Tem sido uma carreira bem conseguida, até porque já conta, entre outros factores, com nomes conhecidos do panorama nacional. Desejo-lhes a maior sorte, como sempre, pois embora não seja um membro activo na banda actualmente, considero-a sempre também como um fruto meu, agora já mais maduro.

O que há planeado em termos de actuações? Recentemente ouvi-vos falar da possibilidade de irem até Espanha, França, Alemanha e Áustria. Isto já é um dado adquirido?
No ano passado ficamos em segundo lugar no concurso Rock On, no Side B, em Benavente, que nos proporcionou alguns concertos de promoção ao EP. O primeiro concerto foi já no passado dia 25 de Fevereiro, com os Kathaarsys, na festa de lançamento do “Sphere Of Morality”, integrada na digressão da conhecida banda espanhola. Iremos estar presentes no dia 30 de Março no MetalPoint, no Porto e posteriormente no Areeiro Open Air 2012. Mais datas se anunciarão no devido tempo. Quanto a uma possível ida para fora de Portugal tudo dependerá da forma como conseguirmos canalizar todas as nossas energias para que tal aconteça. Embora numa altura pouco propícia a gastos, temos em nós esse espírito de aventura, o que deixa em aberto a possibilidade. Nesta fase dependemos também de factores alheios para que tal seja possível, como a receptividade de outras bandas amigas, nomeadamente em Espanha e na Áustria. Estamos num canto da Europa o que desfavorece qualquer banda nacional.

Pese embora seja ainda cedo, como imaginam um próximo registo? Há alguma coisa já a ser pensada nesse sentido?
Certamente que diferente deste e munido de bom gosto musical, mas sempre ao estilo dos Venial Sin. Ainda é um pouco cedo mas confesso que estamos todos bastante motivados para a composição de um álbum. Certo é que manteremos um espírito que não envolva pressão, mas sim gozo pelo que se cria. Tentaremos aproveitar ao máximo e desfrutar de todo o processo de pré-produção de um futuro álbum.

Nuno Costa

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