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Entrevista W.A.K.O.

ROTA DE COLISÃO
“O povo estigmatiza o produto nacional, o que é patético”

O empenho e sagacidade dos W.A.K.O. fizeram com que o grupo de Almeirim ascendesse em pouco mais de quatro anos ao topo das referências do metal nacional, induzidos pela estreia “Deconstructive Essence”, com premonitória expansão no exterior correspondida por uma tournée no Reino Unido e Estados Unidos. Encheram já quase todos os palcos nacionais com o seu corrosivo death/groove metal e hoje, ao segundo ataque, conseguem fazer um notável upgrade no seu som, distanciando-o dos clichés do seu antecessor e do dito metal moderno no geral. Mais obscuro, técnico e imprevisível, “The Road Of Awareness” promete estender a caminhada triunfante dos W.A.K.O. e ressalvar o trabalho sério que vem sendo desenvolvido por muitos iluminados intérpretes nacionais como… Nuno Rodrigues.

Os W.A.K.O. surgem em 2011 manifestamente mais experientes. Em que pontos particulares pensa que foram úteis as tournées efectuadas no estrangeiro?
Todas as tours e vivências que envolveram a banda, tornaram-nos mais sólidos, realistas e deram-nos uma maior perspectiva de parâmetros técnico-profissionais. Daí adveio um método mais arrojado de planificação, preparação de espectáculos, comunicação e criação artística.

Registaram muitos episódios caricatos ou divertidos durante estas viagens?
Muitos e pitorescos... Posso citar um deles: na Flórida, chegámos a um stripclub em que a banda sonora das lap dances era a “My Misery” dos W.A.K.O.. Após isso, a noite foi nossa... mais gratificante e loucamente lisonjeador não poderia ser. Awesome!

Em termos de público, acham que estes concertos abriram-vos a porta para uma segunda experiência?
Sim, queremos com todas as forças repetir tal experiência. O intuito foi mesmo esse, desde o início, ir em tour para cativar cada vez mais pessoas. Os objectivos foram cumpridos nesse sentido. Por tal, devemos regressar para dar uma repercussão maior ao nosso trabalho.

Em Portugal, houve algo mais que conquistaram ou sentem-se já como um nome estabelecido? No fundo, qual é a motivação hoje em dia para actuar por cá?
Longe disso, ainda temos muito a conquistar, mas sabemos que somos uma banda de referência nacional. Claro que não estamos acomodados em nenhuma poltrona, isso é o erro de muitas bandas. Por exemplo, destituíram-nos da oportunidade única de partilhar um palco com Slayer e Megadeth, mas vamos fazer de tudo para reinventar e conseguir um evento deste calibre. Em Portugal sabemos que não podemos fazer muito mais do que já fizemos, mas não é esse o motivo por que nos direccionamos para o plano internacional. O primordial motivo é o de não querermos ser categoricamente mais uma banda portuguesa.

Parecendo que não, passaram-se quatro anos desde a edição de “Deconstructive Essence”. Este largo período entre edições teve que ver com algo mais do que a forte solicitação que tiveram para actuar ou também a renovação de alguns elementos?
Foram todos esses factores: a vasta solicitação para tocar e estender ainda mais o primeiro álbum, a preparação e composição do novo trabalho e, claro, a saída dos elementos e a busca cirúrgica de novos músicos.

Esta renovação está, de alguma forma, relacionada com uma suposta mudança de direcção musical?
Envolveu muita coisa. São atípicamente sórdidas estas situações numa banda; colapso de ideias, vidas pessoais, divergências musicais, planos individuais. Foi um pouco de tudo, mas o que interessa é que superámos essa fase e vivemos num novo ciclo de W.A.K.O..

Partiram para a composição deste álbum com a vontade de mudar alguma coisa ou a sonoridade, visivelmente alimentada por outras influências, que agora apresentam foi o resultado natural do vosso crescimento e da visão que desenvolveram sobre o próprio metal?
Todo o caminho e processos foram normais, engendrados e depois catalisados na nossa sonoridade. Já são nove anos de carreira, aprendemos muito, errámos, vivemos, morremos, apogeus de felicidade, catarses de desespero e motivação... Com tudo isto, somos mais humanos, melhores músicos com uma personalidade forte e vincada… somos, sobretudo, arquitectos do nosso próprio presente e futuro. Quanto à componente musical, enriquecemo-nos muito, somos mais empreendedores e consistentes. Os guitarristas tiveram uma maior instrução musical. Eu, por exemplo, frequentei aulas particulares e comecei a empenhar-me num instrumento. Por certo, toda esta solidificação e o amadurecimento de ideias resultaram num álbum mais ambicioso e complexamente rico.

O espírito saudável que parece viverem com Daniel Cardoso e Pedro Mendes terá sido um factor importante para o resultado final da gravação? A julgar por um dos vossos studio reports, houve muita boa disposição…
Para além da magnificência musical do Daniel e do Pedro e do seu contributo neste álbum, eles são muito próximos dos W.A.K.O.. Principalmente o Daniel que acompanha a banda desde o início – ele gravou o nosso EP e primeiro álbum e agora captou o “The Road Of Awareness”. Para além disso, foi o baterista de estúdio. Melhor amigo e aliado seria impossível.

A decisão de o Daniel Cardoso gravar a bateria surge em que circunstância? É ele também o autor de todas as ideias a esse nível?
No decorrer da gravação do álbum deu-se a saída do nosso baterista. A pessoa que disponibilizou-se logo para o cargo foi o Daniel. Aceitámo-lo de imediato, pois ele reúne todas as virtudes e conhecimentos adequados à nossa banda. Ele conseguiu fazer um trabalho assombroso, na minha opinião, a melhor obra dele a nível de bateria. A sua intervenção na composição foi exemplar. Tínhamos as bases premeditadas e programadas para depois serem recriadas organicamente e aí ele ainda fez melhor. Revestiu as nossas ideias com imensa classe e precisão musical.

A mensagem de “The Road Of Awareness” resume-se a uma crítica social ou há também algo mais pessoal e/ou abstracto?
O título deste álbum assume-se como uma auto-consciência despojada de tudo o que a banda passou para chegar a este ponto. A temática pinta de forma negra, psicadélica e cruel tudo o que vivemos e nos rodeia. Logo, a partir deste idealismo, torna-se uma sátira/crítica social. Este álbum reporta a viagem de um ser imaginário, um produto concebido pela nossa mente, elevando-se num estado onírico, permutando-se através de estados de sonho, edificando o seu caminho por cada experiência abstracta que se envolve. Este tipo de “wonderer”, esta “personna”, desdobra-se em vários “eus”, sofrendo metamorfoses mentais e mesmo físicas, almejando no seu horizonte um desapego total da realidade física na procura de uma final coroação de sua existência. Contudo, no fim de contas, todo esse caminho, esse fluxo de correntes de sonho, torna-se um infindável pesadelo no qual o ser fica aprisionado, como numa cela dentro de uma cela inserida em outra cela... Uma temática livre para interpretação, mas com margem de manobra para se tornar um utensílio interventivo na consciência de cada um de nós.

A banda não teme que alguns temas líricos sejam facilmente esgotáveis ou hoje em dia, face ao estado social e económico do mundo, é cada vez mais necessário “iluminar” certas mentes?
Acho toda a componente lírica de extrema importância. Sempre bebi de diversas fontes, desde a literatura ao cinema, passando pela pintura, etc. Todo o tipo de artes está bem latente em mim. Não aprecio letras que são criadas somente para glorificar a vulgaridade e para “encher chouriços”, desculpem-me a expressão… O músico ou intérprete musical tem de entender que a música, neste caso o metal, alternativo ou rock, tem a responsabilidade de revolucionar consciências e pedagogicamente instruir ou influenciar o pensamento social. Fico com o sentimento de missão cumprida quando um seguidor ou determinada pessoa vem ao meu encontro e diz: “Devido àquela tua letra ou frase, despertou-me a curiosidade para absorver aquele ou outro tipo de literatura” ou noutros campos artísticos. Para mim, este é o melhor complemento ou reconhecimento do verdadeiro sentido da arte: despertar os “adormecidos”. Todos nós temos essa arma nas mãos e temos de saber utilizá-la... Consequentemente, não acho esgotável, mas sim um rio eterno que tem no seu reflexo o espectro da realidade ininterruptamente nefasta em que vivemos.

Uma das grandes apostas para este disco terá sido Josh Wilbur. Algo a repetir?
Foi óptimo trabalhar com alguém tão influente como o Josh. Quem sabe se no próximo álbum não será ele a fazer inteiramente o processo total de gravação...

Entende que em Portugal ainda não existem condições para se oferecer um trabalho ao nível da produção áudio tão completo e rico?
Sim, há. Temos o exemplo do Daniel Cardoso que é a prova máxima de tal concretização, mas também temos de ser realistas. Existem determinadas estruturas maquinais que ainda não estão financeiramente ao alcance dos nossos produtores ou estúdios. Integralmente esse não foi o real motivo para colaborarmos com o Josh, mas sim o “one step further” em termos de exposição e ambição.

Os W.A.K.O. apresentam-se hoje com outro suporte editorial. Houve algum tipo de decepção na curta ligação que tiveram à Casket Music?
A Casket foi mais uma boa etapa na nossa carreira, mas sabemos que não poderiam dar-nos mais do que temos no momento. Optámos agora por uma maior independência e autonomia económica. A Rastilho, a meu ver, garante-nos tal liberdade e estabilidade, denota-se o bom trabalho do Pedro no território nacional. No momento, também negociámos com várias distribuidoras internacionais para dar uma maior continuação ao trabalho da Casket/Copro Records.

Numa fase de inibição consumista, que expectativas têm em termos de vendas?
Não tenho nenhuma visão megalómana! [risos] Sei bem que as vendas serão muito comedidas.

A conquista do mercado actualmente teria muito que ver com alguma estratégia “mágica” para tentar convencer o ouvinte a voltar às lojas de retalho. Acha que ainda é possível reverter a situação ou a tendência é mesmo para o suporte digital e para a pirataria?
Não querendo ser um pessimista totalitário, esta é quase uma situação irreversível. Teria de haver uma radical ou abrupta mudança de mentalidade. Creio que o povo nacional estigmatiza o produto nacional, desvalorizando-o comparativamente à oferta internacional, o que é patético. Na minha opinião, temos das melhores bandas inseridas em diferentes géneros. Por exemplo, W.A.K.O. no death/groove, Switchtense no thrash metal, Men Eater no sludge, Devil In Me no hardcore, Process Of Guilt no doom, The Firstborn no metal experimental, Oblique Rain no prog metal e afins... Ou o povo acorda e começa a apoiar as bandas e as estruturas que as protegem, ou podem esquecer encontrar algum motivo de orgulho para contemplar na música nacional. A partir daí estarão infindavelmente acorrentados à mediocridade ventríloqua que é impingida pela constante propaganda manipuladora. No fundo, este movimento de força que é o metal/rock nacional será unicamente um rebanho inserido em cada indivíduo.

“The Road Of Awareness” está nas lojas há algumas semanas. O que se segue em termos promocionais?
Os próximos passos serão actuar em alguns importantes festivais de verão, tais como o Metal GDL, GSM Fest, Metalgate na Marinha Grande, Ruído Alternativo no Cartaxo, Sardinha de Ferro no Side B, com os Entombed no Hard Club, entre outros concertos promocionais ao álbum. Após actuarmos em solo nacional vamos organizarmo-nos para uma futura tour europeia. Ainda, no preciso momento, estamos a preparar o videoclip promocional de “Road To Awareness”.

Nuno Costa

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