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Entrevista Painted Black

REGAÇO DA ESPERANÇA
“Temos de perseguir aqueles sonhos que sentimos estar mais perto e ir passo a passo”

Depois de dois demo-CD’s auto-financiados, esta banda da Covilhã chega merecidamente ao seu primeiro disco e contracto discográfico. Em evidente evolução ao longo dos últimos anos, apresentam hoje um nível de maturidade e consistência que faz de “Cold Comfort” uma agradável surpresa. Nunca se confinaram ao rótulo Doom, mas apesar da ligação ao estilo o grupo está cada vez mais capaz de comungar de influências Death e Prog e, sobretudo, mais esclarecida ao nível da composição. O persistente e (muito) lúcido Luís Fazendeiro (guitarrista) falou-nos do processo de criação deste primeiro “rebento” da banda.

A que se deve um tão evidente progresso na forma de compor da banda ou, pelo menos, uma tão denunciada mudança?
Apesar de este ser o nosso primeiro álbum e da nossa primeira maquete ter sido lançada há cinco anos, a verdade é que componho há muito mais tempo que isso e penso que é natural que, ao longo dos anos, comece a surgir uma vontade ou um desejo de querer experimentar formas diferentes de expressão através da música. Este factor aliado ao crescimento musical e a uma maior contribuição nos arranjos, de todos os elementos da banda, levou a uma natural evolução no nosso som. Muito mais que apaixonados pelo Metal somos amantes de música e nunca vimos a nossa como algo estanque ou limitada. Dentro da nossa identidade, que ainda estamos a construir, e daquilo que queremos transmitir, há muito espaço para diferentes texturas musicais que iremos com certeza explorar, de forma honesta e com coração.

O Doom passou a não ser a primeira característica dos Painted Black. Têm outras influências que naturalmente transpuseram para este trabalho… Quer falar-nos delas?
Ainda bem que fala nisso porque nós nunca nos vimos como uma banda puramente Doom. Obviamente que não temos nada contra o género, até porque reconhecemos naturalmente a sua influência na nossa música e muitas das nossas bandas favoritas, inclusivamente portuguesas, movem-se nesse imaginário. Apesar de não gostar de encher de rótulos desnecessários uma banda, hoje em dia posso dizer que bebemos de vários estilos para além do Doom, como o Death Metal, algum Prog e música mais atmosférica, longe do universo Metal. Até costumo dizer que o rótulo que melhor nos define é o de “Metal Atmosférico”.

Aqui e ali, ainda que subtilmente, temos o ambiente do chamado post-rock presente. Bandas como Isis ou Cult of Luna interessam-vos e/ou inspiram-vos?

Eu e o Daniel principalmente, ouvimos bastante esse tipo de bandas e recentemente descobrimos os Long Distance Calling que recomendo vivamente. Interessam-nos todas as bandas que nos despertem emoções com a sua música e tudo o que ouvimos acaba inevitavelmente por nos inspirar, nem que seja ao nível do subconsciente. Por exemplo, o Miguel [guitarra solo] gosta bastante de bandas como Pink Floyd e Dream Theater, e tendo ele neste momento um papel mais activo a nível de solos, essas influências acabam por aparecer naturalmente e dão outra cor à nossa música.

Digamos que o futuro da sonoridade dos Painted Black passa por aprofundar a dicotomia melancolia/raiva ou têm perfil para poder vir a aplicar apontamentos à partida desenquadrados como o que têm feito até agora?
Acho que essa dicotomia de que fala já faz parte da nossa identidade, mas ainda é cedo para falar no que vamos fazer no futuro. Podemos muito bem vir a aplicar esses apontamentos “desenquadrados”, até porque uma coisa que queremos manter conscientemente é a variedade dentro da nossa música. De qualquer forma, na parte que me toca, tudo depende daquilo que sair, da inspiração do momento e da eterna luta interna do aspecto mais cerebral da composição VS o sentimento que quero transmitir.

Na composição de “Cold Comfort” quais foram as vossas principais preocupações?
Quando compomos o mais importante é sermos verdadeiros com o que fazemos, porque se forçarmos as coisas a música vai soar “falsa”. Preocupamo-nos sempre em agradar a nós próprios e a sermos cada vez melhores executantes, porque a música só tem a ganhar com isso. Na composição para o álbum simplesmente fomos criando canções ao longo do tempo e limitámo-nos a escolher as que considerámos serem as melhores. Já agora queria aproveitar para agradecer ao meu amigo David Miguel por me fazer olhar para a composição musical de uma maneira que eu nunca tinha feito antes. Sem esse input posso garantir que algumas músicas de “Cold Comfort” nunca iriam existir.

Em termos líricos fala de alguma melancolia relacionada com algo pessoal ou mais generalista?
O Daniel escreve todas as letras e certamente ele responderia melhor a esta pergunta, mas as palavras, tal como a música, são sempre pessoais. Podem vir de experiências dele ou até de algum sentimento que originou a composição de uma certa música, ou até de um filme que o tenha marcado. No álbum temos um exemplo disso mesmo, no tema “Inevitability” onde o Daniel se inspirou no filme “The Fountain” para escrever a letra.

Estar habituado a viver “confortavelmente frio” ou triste é algo tipicamente português. Sentem o “Fado” dentro de vós?
Não diria que esteja directamente ligado a qualquer sentimento típico português, até porque não se deve levar demasiado à letra o título do disco. “Cold Comfort” serve como uma metáfora e até de certa maneira de testemunho ao que sentimos como banda. Procurando o significado da expressão no Google podemos encontrar isto: “Slight consolation or encouragement in the face of a reverse”. De uma forma mais prática é encontrar conforto, consolação ou até mesmo alguma força face às adversidades quando as coisas não resultam como esperávamos. É sentirmos que as coisas podiam ser melhores do que são, mas mesmo assim conseguirmos encontrar outras que nos façam sentir bem.

Sentem que cresceram, certamente… O que vos poderá ter ajuda nisso?
As primeiras pessoas que penso quando se fala em ajuda, são obviamente os produtores que trabalharam connosco no álbum. O Pedro Mendes acompanhou-nos mais tempo no estúdio e foi literalmente o nosso sétimo elemento. Ele deu bastantes ideias quer em termos de arranjos, quer de guitarras, baixo, melodias vocais e não é à toa que o nome dele aparece creditado nos arranjos do álbum. No outro espectro temos o Daniel Cardoso que fez um trabalho excepcional na mistura e na masterização, o que no fundo conseguiu pôr-nos a soar como uma banda a “sério”. Apesar de tudo aquilo que mencionei atrás, da nossa evolução como compositores e músicos, e das músicas estarem todas construídas quando entrámos em estúdio, sem o trabalho destes dois senhores nunca teríamos um resultado tão bom.

Em termos de motivação, é fácil uma banda como a vossa coexistir em Portugal? Actuam o desejável, em condições, escoam o vosso trabalho?
Acho que nunca podemos estar à espera que as coisas aconteçam para nos sentirmos motivados. É verdade que todas as pessoas que trocam algumas palavras de apreço connosco no fim de cada concerto e todas as boas apreciações que aparecem na imprensa, dão-nos algum alento e pelo menos fazem-nos sentir que não estamos assim tão sozinhos como poderíamos pensar. Mas como em tudo na vida temos de nos esforçar para ter aquilo que queremos e nunca é fácil ter uma banda quando tens um emprego das 9h às 18h, e até algumas vezes quando tens mais que um emprego ou passas por uma situação de desemprego. Não é fácil, mas uma das razões de os Painted Black existirem é o de servir como escape a isto tudo, e termos um veículo onde podemos depositar os nossos sonhos, as nossas ambições e a nossa paixão em fazer música. Também gostamos muito de tocar ao vivo, mas infelizmente não têm aparecido muitas oportunidades, apesar de lutarmos por elas. Quanto à questão do escoamento do nosso trabalho, posso dizer que as nossas duas demos estão esgotadas. Relativamente ao álbum a Ethereal Sound Works ou a distribuidora Compact Records poderão responder melhor.

Agora que têm uma estrutura editorial profissional já não podem mais arrebatar a categoria de “Melhor Banda Portuguesa Sem Contracto”! Como surgiu e está a resultar esta colaboração?
A nossa relação com a Ethereal Sound Works já vem do tempo das maquetes. Na altura pediram algumas cópias para venderem na loja online e desde então sempre suscitaram grande interesse pela nossa música. Quando chegou a altura de sondar editoras para lançar o nosso álbum eles fizeram-nos a melhor proposta e naturalmente aceitámos trabalhar com eles. Até agora não temos nenhuma razão de queixa e eles estão bastante empenhados em divulgar o nosso trabalho, seja no envio de material para rádios como para publicações de metal de formato digital e físico. É verdade que agora já não podemos arrebatar a categoria de “Melhor Banda Portuguesa Sem Contracto” da Loud!, mas se tal acontecesse seria mau sinal! [risos] Há sempre outras categorias e obviamente que sentir o apoio de quem nos ouve será sempre uma das nossas maiores alegrias.

Como já vem sendo hábito com os vossos trabalhos, “Cold Comfort” está a ser bem recebido pelos Media. Isto faz-vos sonhar?
É sempre muito bom quando lanças um disco e este é bem aceite pelas pessoas, mas naturalmente nada alguma vez é um total “mar de rosas”. Nunca vamos agradar a todos e irão sempre aparecer palavras mais acutilantes e depreciativas em relação à nossa música. Faz parte da vida e sabíamos à partida, desde que decidimos mostrar o que fazemos, que teríamos que estar preparados para todo o tipo de crítica. Se as boas críticas nos fazem sonhar? O nosso sonho é fazer música e lutar por ter melhores condições para o fazer. Acredito que todos nós gostávamos de viver disto mas acho que é um sonho que alimentamos cada vez menos porque somos forçados a olhar em volta e apercebermo-nos da crua realidade. Temos de perseguir aqueles sonhos que sentimos mais perto e ir passo a passo.

Objectivamente, como está traçado o plano promocional da vossa estreia em álbum, nomeadamente ao vivo?
Estamos a tentar a marcar o máximo de concertos possível, o que nem sempre é uma tarefa fácil. Algumas vezes a nossa vida profissional não nos permite aceitar determinados convites e já aconteceu noutros casos uma primeira proposta apresentada não se concretizar por motivos alheios aos promotores que nos contactam. No entanto, vamos ter no final de Agosto uma data com os australianos Be’lakor no Side B, em Benavente, e estamos bastante entusiasmados. Fora os concertos estamos a apostar na divulgação a nível de rádios, revistas, blogues e sites especializados. Começamos também a sentir alguma divulgação “boca-a-boca” que nos alegra bastante e nos faz sentir que o disco aos poucos e poucos está a chegar às pessoas.

Nuno Costa

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